A empresa usou seus estoques para reduzir custos. Isso pode beneficiar a geração de caixa e receita líquida neste trimestre, diz Fabio Lemos, sócio da Fatorial Investimentos. No entanto, esse movimento tem fôlego curto e pode não se repetir com a mesma intensidade nos próximos trimestres.
Por ora, não há grandes alertas no radar. Mas o cenário internacional, marcado pela escalada das tensões entre China e Estados Unidos, gera cautela. Um agravamento da guerra comercial pode provocar uma recessão global, derrubar o preço do minério e pressionar a lucratividade da Vale.
Porém, “quando a guerra comercial amenizar, a Vale terá espaço para subir preços e elevar a produção, aliado ao fato de ter reduzido os seus estoques”, diz Hugo Queiroz, sócio e analista da L4 Capital.
Minério de ferro e dividendos: relação direta
O preço do minério de ferro tem impacto direto no dividend yield (retorno em dividendos) da Vale. Marco Saravalle, analista da MSX Invest, fez simulações: com minério a US$ 100, a Vale entregaria dividend yield de 7% em 2025; a US$ 90, o retorno em proventos cairia para 6,5%; e com o preço do minério a US$ 75, o yield seria de 5,5%. Por outro lado, se a commodity subir para US$ 120, o retorno em dividendos pode chegar a 8,2%.
Até 20 de abril, o minério era negociado a 711 iuanes na Bolsa de Dalian (China), equivalente a US$ 97,40 a tonelada.
Saravalle ainda acredita em novas quedas para o minério no decorrer do ano, mas pouco expressivas.
Para Bruno Oliveira, analista do Vida de Acionista, o intervalo mais provável para o minério é entre US$ 90 e US$ 95 neste ano. O que abre um espaço para comprar Vale em doses homeopáticas.
Metas ambiciosas de produção
A Vale reforçou sua meta de produzir entre 325 e 335 milhões de toneladas de minério de ferro em 2025. Para analistas, a meta ainda é plausível, apesar da queda no início do ano.
Lemos avalia que, historicamente, o 1º trimestre é mais fraco devido às chuvas. Sem novos eventos climáticos extremos ou paradas inesperadas, a estrutura atual permite alcançar o volume projetado. Produções maiores nos próximos trimestres ajudariam a diluir custos fixos e, com isso, aumentar a geração de caixa, o que favorece a distribuição de dividendos.
Para Queiroz, os desafios são transitórios. Mesmo com a volatilidade esperada nos preços do minério até 2026, a Vale segue resiliente, com demanda firme e margens elevadas. Portanto, não teremos mudança abrupta na remuneração dos acionistas.
A Vale está barata
Para muitos analistas, dados indicam que a ação está barata, mas não necessariamente é o melhor momento para comprar. A mineradora negocia com múltiplo EV/EBITDA de 4,24 vezes, e no projetado para os próximos 12 meses de 3,5 vezes. Ambos estão abaixo da média histórica de 5 vezes e 20% inferior aos rivais como Rio Tinto e BHP.
Felipe Paletta, estrategista da EQI Research, lembra que essa comparação não considera períodos críticos. É o caso dos desastres de Mariana e Brumadinho, que desvalorizaram com força a ação. “É importante comparar ciclos mais longos para ter uma referência de preços”, afirma. Lemos acrescenta que a ação pode ficar ainda mais descontada diante da incerteza global e dos desafios da China em estimular sua economia.
Qual é a recomendação das corretoras?
A maior parte dos analistas possuem recomendação de compra ou manter, mas com sinal de alerta ligado. O BB Investimentos rebaixou a recomendação das ações VALE3 de compra para neutra e reduziu o preço-alvo (que indica quanto a ação vai valorizar este ano) de R$ 74 para R$ 65, citando a baixa visibilidade quanto aos desdobramentos do conflito comercial e possíveis retaliações internacionais.
Paletta adota uma leitura cautelosa. Para ele, um trimestre fraco não é motivo para revisar projeções, mas também não garante que elas se sustentem. “Não dá para cravar se a empresa ganha ou perde capacidade de entrega olhando apenas esse relatório. A sinalização dos executivos no balanço será crucial para alinhar expectativas”, diz.
Para Oliveira, volatilidade da ação é oportunidade. Ele destaca que, para quem foca em renda passiva, as oscilações de VALE3 e do preço do minério de ferro devem ser encaradas como brechas para aumentar o número de ações, mas reforça que as compras devem ser feitas aos poucos.
Ainda há expectativa de valorização. Segundo o consenso do TradeMap, com 10 instituições consultadas, o preço-alvo médio de VALE3 para dezembro é de R$ 71,68, uma alta potencial de 36,37%.
E para os dividendos? Vale a pena comprar?
Se a valorização das ações divide opiniões, os dividendos seguem sendo um atrativo. A projeção média de dividend yield (retorno em dividendos) para 2025 é de 7,68%, no consenso de mercado. Já entre os analistas consultados pela coluna, as estimativas variam entre 6,62% e 15%.
Boa parte dos analistas não espera dividendos extraordinários neste ano. Oliveira lembra que os pagamentos do acordo de Mariana e Brumadinho somam R$ 11 bilhões em 2025, limitando naturalmente os proventos. Mas a partir de 2026, o investidor já nota melhorias nos dividendos.
Para o analista do Vida de Acionista, a Vale não deve ser a principal ação de uma carteira de renda passiva neste momento, e sim uma posição complementar, a ser considerada depois de empresas mais estáveis como bancos, elétricas e seguradoras.
Para quem segue estratégias focadas em renda passiva, como as de Luiz Barsi Filho ou do método de Décio Bazin, a Vale ainda é relevante porque paga mais do que 6% de dividend yield. Em 2024, a empresa distribuiu R$ 5,35 por ação em proventos, o que representou um yield de 9,81%.
A mineradora remunera os seus acionistas semestralmente, em março e setembro, e já fez um pagamento neste ano de R$ 2,14. Desta forma, o próximo dividendo só deve pingar na conta do investidor em setembro. A companhia tem como política distribuir 30% do seu ebitda (lucros, antes de juros, imposto, depreciação e amortização) menos os investimentos correntes.
Apesar da tempestade perfeita, a Vale ainda segue com sólidos fundamentos e gerando caixa robusto. O ponto da virada é se você, investidor, quer correr o risco. Se a resposta for sim, analistas apontam que nem precisa esperar ao balanço para comprar, as cartas já estão na mesa.
Reportagem
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